4 - Bispo

José Marello, Bispo
Junto aos Salesianos de Turim no ano de 1991
por ocasião do 50º aniversário do
oratório Salesiano
Bispo

São José Marello, uma vida exemplar e edificante
Capítulo 4

73 - Na carta de apresentação de Marello como o novo bispo de Acqui, enviada, aos 28 de novembro de 1888, ao vigário Geral, Pe. Pagella, Dom Ronco o apresenta como um homem empenhado na causa dos pobres, particularmente, quando, em 1884 ele  manifestou uma preocupação especial por eles em Santa Chiara com o funcionamento do Asilo que acolhia epiléticos, cegos, apopléticos,  aleijados, bobos e velhos que não podiam se movimentar. Salientou também que Marello, no ano de 1885, tinha tomado a generosa decisão de ir morar no meio dos seus pobres, os quais ele amava com coração de pai. Finaliza a sua carta declarando-o: “uma pérola preciosa e uma bênção que Asti perde e que Acqui ganha. A sua vida é um constante exercício de virtudes, de zelo pela glória de Deus, para a saúde das almas e de obras misericordiosas pelos pobres. E todo este tesouro está escondido sob o invólucro da mais singela humildade...”

74 - Marello foi nomeado bispo de Acqui, uma vasta diocese, deslocada, em boa parte, sobre os montes dos Apeninos Ligure, contando com 121 paróquias  e cerca de 125 mil habitantes. A sua nomeação se deu  no dia 23 de novembro de 1888, quando ele estava com seu 44 anos de idade. Marello ao receber a noticia de sua escolha como bispo foi se aconselhar com o cardeal de Turim, Gaetano Alimonda, o qual pediu para aceitar a nomeação; desta maneira, se colocou com total abandono na vontade de Deus, escolhendo como modelo para seu episcopado o bispo de Genebra, São Francisco de Sales. O seu brasão episcopal, desenhado por ele mesmo, foi representado por um mar agitado sobre o qual brilha uma estrela com o monograma de Maria (MA) e se lê na cartela o lema escolhido por: ”Iter para tutum” - “Prepara um caminho para todos”.

75 - A tradição diz que foi o Papa Silvestre quem criou a diocese de Acqui  e até o século IX não se conheceu os nomes dos bispos dessa diocese; apenas 7 nomes foram conhecidos até Marello. Era diocese que tinha produzido homens ilustres pela sabedoria e doutrina como o bispo Maggiorino, Baudolino, Guido, sobretudo este último, patrono principal da diocese a qual a governou por 36 anos. Dessa diocese saíram também vários bispos, dentre os quais São Paulo da Cruz, fundador da Ordem dos Carmelitas Descalços de Santa Cruz e da Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo (Passionistas). A Catedral de Acqui foi construída por São Guido e dedicada à Bem-aventurada Maria Assunta. Com suas 121 paróquias, tinha 504 igrejas e 5 Famílias religiosas. Quando Marello assumiu a diocese, esta tinha 180 seminaristas, dos quais 78 entre filósofos e teólogos e os demais eram seminaristas menores.

76. O período episcopal de Marello foi de apenas seis anos e meio, mas foi de intensa atividade. Neste período visitou todas as 125 paróquias, exceto a de Lussito, que, todavia já havia visitado rapidamente a pé,  pois se encontrava perto da cidade e havia dito ao pároco que voltaria para a visita oficial quando ficasse pronta a igreja nova que ele queria benzê-la.

77 - Por ser a sua diocese plantada em boa parte sobre os montes do dos apeninos Ligure, as suas localidades nem sempre eram de fácil acesso, mas mesmo as mais inacessíveis ele as subiu visitando-as sendo sempre acolhido com muito carinho e como um santo.

78 - Em Cassine, a 12 quilômetros de Acqui, a qual tinha sido a primeira cidade a acolhê-lo como bispo em 1889 com a banda de música municipal, por ocasião de sua visita pastoral não foi bem recebido por conta da política anti-clerical, sendo que nem o prefeito e nem seus assessores se dispuseram a recebê-lo por essa ocasião. Contudo, já na igreja, Marello começou uma bonita pregação que inflamava o coração de todos os presentes, de sorte que aos poucos muitos que estavam de fora começaram a ir à igreja, inclusive o prefeito. Na tarde do dia seguinte, no final da visita, o prefeito com todos os seus assessores se apresentaram ao Marello dando suas desculpas pelo ocorrido. É que a atitude afável de Marello cativava.

79 - O seminário de Acqui no ano de 1891, quando Marello era o bispo, contava com 78 seminaristas  maiores entre filósofos e teólogos e 102 seminaristas menores. O reitor do seminário era  Pe. Giuseppe Pagella que tinha uma grande consideração pelo seu bispo e falava dele com profunda admiração aos seminaristas e estes o tinham como um santo. Por ocasião da disputa que Marello enfrentou com a ”Piccola Casa di Torino” a respeito de Santa Chiara Pe. Pagella assim se exprimiu: ”Se eu tivesse que gastar nesta causa o meu patrimônio inteiro, fá-lo-ia de boa vontade, porque esta foi a última vontade do meu santo bispo”.

80 -  Pe. Pagella era muito capaz e tinha muita influência  no clero e entre os civis. O próprio Papa Leão XIII tinha manifestado seu apreço por Pagella, recomendando-o ao monsenhor Disma Marchese de levar muito em consideração aPe. Pagella, “que é o melhore vigário geral da Itália”. Seu valor era indiscutível, mas enérgico e de caráter oposto ao de Marello. Possuía um caráter forte e impulsivo. Aos olhos dos padres da diocese tinha-se muitas vezes a impressão de que Marello fazia aquilo que Pagella dizia.

81 - Apenas aparentemente Pagella demonstrava mandar na diocese, mesmo porque era um canonista muito preparado do qual Marello se servia para o governo de sua diocese. Tendo-o ao seu lado Marello conseguiu amenizar o seu caráter forte e a torná-lo dócil. Na sua humildade ele deixava que Pagella despontasse e o tinha em grande consideração ao ponto de afirmar: ”É um prazer ser  bispo com um vigário como esse”.

82 - A bondade e santidade do bispo Marello era constatada tanto pelos sacerdotes da diocese de Acqui como também pelo povo, basta lembrar  o testemunho de algumas pessoas durante as visitas pastorais que ele realizou: Em Altare o povo dizia dele: ” Este bispo é um santo”. Pe. Disma afirmou, em 1924, que durante os seus 58 anos de ministério sacerdotal tinha recebido inúmeras visitas pastorais, mas a que mais ficou impressa em sua mente foi a de Dom Marello realizada em 1891,  pois “os dois dias de sua permanência como meu hóspede foram para mim dias de paraíso. Acompanhou-me na comunhão geral de 600 pessoas e administrou 200 crismas e vi várias vezes descer de seus olhos lágrimas de consolação...”

83 - Por ocasião das comemorações pelos cem anos de morte de São Luiz Gonzaga Marello organizou uma peregrinação em Roma com seus sacerdotes e leigos da diocese. Na ocasião todo o grupo participou da audiência com o Papa Leão XIII. Nesta oportunidade, relata Pe. Peloso e também Pe.Alfonso Mistrângelo (que depois será cardeal de Firenze): “O santo Padre passava transportado em sua cadeira gestatória abençoando as várias filas de peregrinos, Quando ele chegou perto de nós, um dos seus acompanhantes lhe disse: ‘bispo de Acqui’ e o Papa perguntou: ‘bispo de Áquila”?’- ‘Não, bispo de Acqui’. Então o Papa parou e disse: ‘Oh, Acqui, Acqui! Abençôo - vos, abençôo a diocese. Ao voltardes “dizei a todos que enviei para Acqui ‘Uma pérola de bispo’”. Às palavras do Papa, Dom Marello ficou todo vermelho, afirma Pe. Peloso, e dirigiu a conversa para outro assunto.

84 - O cardeal Mistrângelo, escreveu em 1923 o acontecimento da denominação ‘pérola de bispo’ dada por Leão XIII explicava que tal era Marello; “ele tinha da pérola a candura, a suave luz, os reflexos iridescentes e encantadores. A sua alma, bela e virtuosa, era espelhada nos seus olhos serenos, no seu sorriso angélico e na compostura simples. Digno e amável. Bastava se aproximar dele, conversar com ele e ouvi-lo para se ficar fascinado; estava-se diante de um novo Francisco de Sales”.

85 - O estilo de pregação de Marello era simples e pastoral, como publicou o boletim semanal de Acqui, “L’Ancora”, em 1923: ”Tinha uma eloqüência simples, paterna e cativante. A sua pregação era calma, sem artifícios de oratória, mas prática e sempre intercalada de fatos edificantes tirados da vida dos santos, das quais era assíduo leitor”. O mesmo se diga sobre a sua maneira de escrever, conforme observa a irmã Miotti  que as suas “cartas pastorais conservam um estilo fácil e claro. Ao lê-las não se encontram idéias cultas, também se manifestam uma vasta e profunda cultura, particularmente patrística e bíblica, que com humildade coloca ao serviço do povo de Deus para edificá-lo”.

86 - Quando Marello devia viajar tinha quase sempre a companhia de Battista, seu empregado, o qual o acompanhava à estação ferroviária a pé porque não utilizava de meios de transporte, e isso não por avareza, mas por penitência. Sempre que devia tomar o trem devia sair de casa um pouco adiantado porque durante o percurso as crianças acorriam ao seu encontro e ele parava para acariciá-las e abençoá-las.

87 - Marello tinha uma grande preocupação com o decoro das igrejas e por isso quando visitou a igreja de Olmo Gentile ao encontrá-la muito pobre e desprovida de pia batismal que era substituída por uma pequena bacia, ao voltar para casa enviou para a referida igreja uma pia batismal de pedra a qual foi conservada como o melhor presente recebido pela população.

88 - Nas suas visitas pastorais não se preocupava com o cansaço e com os incômodos. Ao celebrar em Ciglione saiu da celebração com as roupas todas molhadas de suor e teve que ira trocá-las deixando-as no quarto. A empregada encarregada de lavá-las ao tomá-las  ficou tão impressionada com o estado delas que veio correndo dizer ao pároco: ”Padre, aquelas não são roupas de um bispo, mas de um pobre”.

89 - Marello se preocupava com todos indistintamente de suas qualificações e desejava que os seus sacerdotes estivessem presentes na vida de todos. Pe. Bistolfi, pároco de Mioglia, lembra que Marello certa vez lhe disse: ”O senhor joga ‘pallone eslastico’ muito bem” ao que ele respondeu: “é preciso estar junto com esse povo. Precisa compreender os seus problemas. São pessoas sofridas, precisamos ajudá-las”.

90 - Por possuir dons artísticos Marello desenhou o seu próprio brasão episcopal o qual delineava o mar com águas movimentadas tendo sobre si uma estrela com o monograma de Maria “MA” que representava as iniciais de “MA-r”, “MA-rello”, “MA-ria”. Na parte inferior do brasão escreveu a frase “Iter para tutum”.

91 - O Irmão Benedetto Coppo relata que certa vez estava na residência episcopal para almoçar com Dom Marello e seu secretário, Pe. Peloso e aos sentarem à mesa perceberam que faltava algo, então Dom Marello disse ao Battista que estava de serviço: “Battista, precisamos de uma escada, por favor, busque-a”. Imediatamente o Battista buscou a escada e então Marello pediu-lhe para colocá-la contra a parede e subí-la. Depois lhe disse em tom de brincadeira: ”Battista, olha ai do alto, vê se falta alguma coisa sobre a mesa?”. Faltava o sal, mas a intenção em tom de brincadeira era de lhe advertir que não havia sal na mesa, pois o Battista era às vezes um pouco distraído. Depois bastava lembrar a escada para o Battista não esquecer mais nada.

92 - Pe. Giovanni Rabino afirma a respeito de Marello que “Jamais tinha visto um homem possuidor de tanta mansidão e docilidade, sem nenhum momento de impaciência, o que se percebe nele o esforço em frear a sua  índole natural de tal forma que a docilidade lhe parecia uma sua segunda natureza”. Outro sacerdote que o conheceu, Pe. Luigi Guastavigna afirma: “Dom Marello, para dizer em poucas palavras, era a santidade e a simplicidade em pessoa”. Também Pe. Ernesto Voglino diz: ”Era a piedade  personalizada”.

93 - Marello vivia um verdadeiro espírito de pobreza conforme testemunha a Irmã Tereza Sisto: ”Sempre lavei, passei e arrumei as roupas de Dom Marello e notei que ele tinha roupas pobres, embora em ordem e limpas”. Sua simplicidade era tal que a cozinheira dizia que não tinha nenhuma dificuldade em servi-lo, pois estava sempre contente com qualquer coisa que preparasse. Sempre atento aos necessitados ele colocava todos os dias à disposição  uma determinada quantia que gastaria com os pobres e a distribuía. A sua caridade para com o próximo, ele a manifestava também de uma outra maneira: procurava cobrir com o manto da caridade os defeitos do próximo.

94 - Numa visita pastoral à paróquia de Montechiaro d’Acqui Marello levou para seu  quarto as relíquias ex ligno S. Crucis e passou aproximadamente duas horas diante desta relíquia em adoração. Isso demonstra a sua devoção à paixão de Cristo.

95 - Na visita pastoral à paróquia de Cassinelle, ao início da celebração da missa aconteceu que tinha se esquecido o turíbulo e o incenso, mas Marello sem nenhum sinal de impaciência esperou que fosse providenciá-los. Foi preciso esperar aproximadamente 20 minutos, mas ele sempre calmo conversava com o pároco e com os coroinhas até que chegou o turíbulo e ele com muita calma iniciou a celebração sem demonstrar nenhum sinal de perturbação, para a admiração dos fieis presentes.

96 - Por ocasião da visita pastoral em Tiglieto durante a comunhão veio a falta de hóstias consagradas para muitos fiéis. Marello ao perceber que faltavam as hóstias teve a paciência de preencher o tempo com pregação enquanto as hóstias eram preparadas (cozidas e cortadas) e depois consagradas por um sacerdote em um altar lateral, sem dar o mínimo sinal de contragosto.

97 - A simplicidade de Marello chegava a coisas tão simples como o episódio relatado por Pe. Lorenzo Franco: ”Marello se fazia pequeno com os pequenos e não se esquecia nenhum de nós. O primeiro ano em que os Irmãos foram passar as férias em Strevi, Marello foi com eles dentro do rio Bormida e ali recolheu duas pedrinhas, uma branca e outra preta, e a entregou ao assistente (Irmão Paulo) dizendo-lhe de levá-las ao Franchino, que era eu e disse-lhe de lembrar-me de rezar e ser bom menino”. “Outra vez, ainda em Strevi, por ocasião das férias dos seminaristas estes saíram para um passeio, mas um deles não pode ir porque tinha machucado o pé. Ao vê-lo sozinho Marello ouviu a explicação dele e depois lhe disse: Muito bem, diverte-te aqui mesmo, monta neste cavalinho, e quando ele montou, Marello tomou o cabresto e puxou o cavalo pelos caminhos do jardim de Strevi.”. O seminarista que Marello conduziu pelos caminhos do jardim de Strevi era Luigi Garberoglio, seu terceiro sucessor na direção da Congregação. Strevi é uma localidade a poucos quilômetros de Acqui às margens do rio Bormida, esta tinha se tornado o refúgio de Dom Marello. Era um antigo convento franciscano do século XVI preparado como residência de verão dos bispos de Acqui.

98 - Em fevereiro de 1888, o bispo de Acqui, Dom Giuseppe Sciandra, estava doente e velho, impossibilitado de celebrar uma ordenação sacerdotal o diácono Lorenzo Del Ponte foi enviado a Asti para ser ordenado por Dom Ronco, ao voltar para Acqui o néo-sacerdote foi interrogado pelo Vigário Geral, Pe. Pagella:”Que impressão teve de Asti?”, ao que Del Ponte respondeu:”Assistindo o bispo havia um cônego tão composto, devoto e sereno que parecia um anjo do Paraíso”. Um ano depois Marello foi apresentado por Pe. Pagella como bispo de Acqui como uma “Gema de bispo”. Sua preciosidade era ancorada na sua humildade, como no exemplo que deu quando os seus colegas Pe. Riccio, Delaude, Rossetti e Motta vieram lhe dar os parabéns pelo episcopado e pediram-lhe a bênção, mas Marello hesitava, pois eram seus colegas de juventude. Estariam brincado ou não? Então um deles lhe disse em piemontês: “Su, su, fa nen la ciula” (Vamos depressa, não seja bobo) e Marello abençoou-os.

99 – Marello, bispo, não se preocupava com o tipo de comida e comia muito pouco sem nunca dar ordens à cozinheira sobre refeições e nunca reclamava do que lhe era servido. Sua cozinheira dizia que ele estava sempre contente com qualquer coisa.

100 - O seu camareiro Felice Balostro afirma que Marello comia pouco “Lembro que lhe preparavam normalmente um pãozinho de aproximadamente cem gramas, que às vezes não comia por inteiro no intervalo entre o almoço e o jantar”.

101 - Marello tirava muito pouco tempo para o descanso e quando necessitava de fazer alguns exercícios físicos por causa de sua saúde frágil, caminhava um pouco no pátio da casa episcopal.

102 - Seu sermão costumava ser longo, mas o povo o ouvia com prazer, pois diziam que aquilo que ele pregava saia-lhe do coração.

103 - Se houvesse algum doente para ser visitado, ninguém conseguia segurá-lo, mesmo que fosse em meio ao mais rígido inverno ou nevasse. De fato, era muito solícito para os outros e esquecia-se de si mesmo.

104 - Tinha uma grande preocupação com as pessoas. Uma vez o seu secretário sentia-se um pouco estressado, ele com aquele seu olhar penetrante apercebeu-se disso e sem alarde lhe disse: ”Olha, Pe. Pietro, amanhã eu vou-me vestir como um simples padre e depois vamos fazer juntos um bom passeio” . No dia seguinte, fizeram o passeio. Na verdade o secretário não desconfiou de nada e pensou que devia mesmo acompanhá-lo, e só mais tarde, refletindo sobre o fato, percebeu que ele lhe tinha feito aquela fineza para lhe proporcionar uma oportunidade de descanso.

105 - A ordem na cúria episcopal era para que qualquer um fosse admitido à audiência com ele e a qualquer hora que fosse. Ele atendia todos com bondade e grande interesse, sem se chatear com ninguém. A respeito disso narra  Pe. Cortona “Um dia, uma pessoa começou a contar-lhe uma lengalenga sem fim que cansaria  até um morto, enquanto eu esperava o momento para conversar com ele coisas muito importantes. Quando ela terminou e se despediu, eu não pude conter-me de lhe observar:’Excelência, como consegue interessar-se tanto de uma coisa tão insignificante?’ E ele me responde: ‘A nós parecem coisa insignificantes, mas para eles são coisas muito importantes. Se queremos que os outros se interessem pelas nossas coisas, devemos dar atenção às misérias e às mágoas dos outros”.

106 - O seu camareiro Felice confirma que os seus sacerdotes tinham o prazer de conversar com ele: “Nunca os sacerdotes que iam procurá-lo me perguntavam com antecedência qual era o seu estado de humor, e ao saírem nunca percebi que tinham ficado chateados ou descontentes”.

107 - Monsenhor Soave, que era vigário da Catedral de Acqui e depois se tornou pároco de Fontanile, afirma: ” Às vezes eu ia procurar o bispo e ele me recebia com festa, em seguida sentava-se no sofá e não queria que eu me sentasse numa poltrona, mas dizia” ‘senta-te aqui no sofá perto de mim para podermos conversar melhor’”.

108 - Relata Pe. Vittorio Macciò que um dia escreveu a Dom Marello uma carta não muito educada porque desejava que o bispo tomasse uma decisão drástica em relação a um sacerdote, enquanto que Marello o exortava a ter paciência e a rezar. Depois de algum tempo foi à Acqui para pedir desculpas ao bispo esperando encontrá-lo desgostoso, mas ao invés o encontrou muito afável  e ao contrário de uma reprimenda, Marello assumiu suas desculpas dizendo-lhe:”Quando a gente está com a cabeça quente não consegue medir as palavras”.

109 - Marello era uma pessoa tão afável e admirada que o seu Vigário Geral, Pe. Pagella homem inteligentíssimo e também temido como Vigário, afirma que pelo Marello teria se jogado ao fogo. Dele são também estas palavras por ocasião da morte de Marello em Savona: ”O Senhor quebrou o molde, nunca mais fará um homem assim”.

110 - No trato com as pessoas Marello era muito espontâneo e sempre tinha uma palavra boa para dizer-lhes. Numa de suas visitas pastorais em Ciglione foi recebido com festa pela população não faltando a banda de música. Na pausa de descanso dos músicos conversando com um e outro chegou perto de um velho que tocava um bumbo; acariciou-lhe a longa barba branca e lhe sorrindo disse: “Você é o mais barulhento de todos”.

111 - Na visita que fez à Ricaldone, conquistou de tal maneira os corações daquele povo que, à sua partida o acompanharam com a banda por vários quilômetros, até a outra localidade vizinha. Em Cairo Montenotte, uma aldeia de marca anti-clerical, foi acolhido com alegria tão logo o povo o viu abraçar uma menina dentre os que o recepcionavam. Numa outra aldeia denominada de Morbello, a sua visita coincidiu com a chegada de uma forte tempestade, arruinando toda a colheita,  mas a sua presença foi uma bênção para aquele povo que recebeu dele conforto e resignação pela perda da colheita.

112 - Como bispo escreveu aos seus diocesanos sete cartas pastorais. Na primeira de 1889 transmitiu para todos os diocesanos uma mensagem de Paz. Depois escreveu sobre a Visita Pastoral, a Penitência, a Educação dos filhos, o Respeito humano, o Catecismo e sobre o Empenho Missionário. Homem dinâmico, bispo consciente de sua missão, Marello dispunha ainda de tempo para a sua Congregação, sendo superior dela e da Obra de Santa Chiara até a sua morte, para ajudar os bispos vizinhos, além de participar do I Congresso catequético italiano de Piacenza, participar em Roma das celebrações pelo III centenário da morte de São Luiz Gonzaga, onde pela ocasião  o Papa Leão XIII referiu-se a ele como “uma pérola de  bispo”. Participou também em Gênova, em 1892 do I Congresso Católico Italiano e em 1894, participou enfim, do II Congresso eucarístico Italiano em Turim.

113 - Pe. Giovanni Rabino afirma que Marello continuava fazendo em Acqui aquilo que fazia em Asti e ressalta que jamais tinha visto uma pessoa tão regularmente calma e dócil, sem jamais ter manifestado um ímpeto de impaciência, o que se podia entender o seu empenho em frear sua índole natural, de maneira que a docilidade parecia nele uma segunda natureza.

114 - É fácil encontrar afirmações como um sabor de elogio enfático sobre a pessoa de Marello, tais como: “Dom Marello, para se resumir em poucas palavras, era a santidade e a simplicidade em pessoa” (Pe. Luigi Gustavigna); “Era a piedade personificada” (Pe. Ernesto Vogliono)

115 - Pe. Rosotti testemunha que Marello lhe chamava a atenção pela sua piedade quando se encontrava na capela da Vila de Strevi, na qual ele o viu a rezar muitas vezes sozinho, “... ajoelhado diante do sacrário e tão absorto na oração que parecia que se estivesse vendo o próprio Jesus”. Muitas vezes parecia que seu rosto se transfigurasse e quando celebrava a missa, não apenas manifestava intimamente que estava persuadido dos mistérios que lembrava, mas agia como se fosse uma só coisa com Jesus. Ele ia todas as noites rezar o rosário na capela de Strevi e no domingo em que a igreja era aberta ao público, rezava o rosário de joelhos no mesmo lugar diante do Sacrário. Em seguida participava da bênção eucarística, dada por um outro sacerdote e depois distribuía santinhos para as crianças.

116 - Um dia, os irmãos que estavam com Marello em Strevi viram um sacerdote sair da audiência com um pacote nas mãos e muito contente; ao procurarem a razão de tanta alegria deste pároco, souberam que o bispo tinha lhe presenteado um turíbulo para as sua paupérrima paróquia, tão pobre que o referido sacerdote  utilizava até então para as incensações litúrgicas, um turíbulo de terracota. Um fato semelhante, relata o irmão Benedetto Coppo, o qual viu na residência episcopal um pároco que tinha descido da montanha para conversar com Marello e ao sair dali muito contente, levava de presente uma casula. De fato, ninguém que fosse buscar como esse padre uma ajuda, saía de mãos vazias.  Era sobretudo notável em Marello a sua bondade de coração, a sua mansidão e a docilidade em todas as coisas e para com todos, sem jamais manifestar uma atitude de impaciência, mas calma, serenidade e tratamento afável com todos.

117 - Pe. Giovanni Cristiano, um pároco ancião de 85 anos de idade,   relatou este seu episódio pessoal ocorrido em sua vida de sacerdote: “Um dia, encontrando-me muito triste pela possibilidade de perder completamente a visão, sendo eu já cego de um olho, dirigi-me até Dom Marello para receber  um pouco de conforto e alguns conselhos, pois já tinha a firme resolução de entregar a minha demissão como pároco. Marello me acolheu e deixou-me desabafar, depois me disse sorrindo: - ‘Esta é uma prova que o Senhor lhe quer muito bem e que não é abandonado por ele; volte contente para os seus paroquianos pois Deus lhe dará forças e coragem em para desempenhar o seus deveres e lhe conservará o pouco de visão que tem por muitos e muitos anos’ - e a sua profecia se concretizou. Hoje estou com 85 anos de idade e 58 de ministério pastoral, são de mente e de corpo e com a mesma visão sem o uso de óculos e por isso posso continuar desempenhando as minhas tarefas de pároco nesta alpestre paróquia sem muitos problemas”. Esse mesmo pároco recorda que por ocasião de suas bodas de prata sacerdotal, em 1891, recebeu a presença de Dom Marello o qual ficou dois dias com ele,  e 23 anos depois (em 1924) relatava que de todas as visitas dos bispos que recebera durante os seus 58  longos anos de ministério, aquela que mais ficou marcada em sua vida foi a de Dom Marello, ocorrida em 1891, pois os dois dias que permaneceu como seu agradabilíssimo hóspede foram para ele dias de paraíso.

118 - Marello como bispo de Acqui visitou todas as 121 paróquias de sua diocese, quase todas cidadezinhas da região astigina com as características colinas do Monferrato, famosas pelas suas vinhas e célebres pelos seus vinhos ’dolce moscato bianco’. Em todas essas ele era acolhido com grande festa. Em Moasca os fiéis lhe prepararam um tapete de flores desde a casa paroquial até a igreja. Nestas suas visitas eram manifestadas as suas pequenas atenções como a de doar, ao final da visita 20 liras para a empregada doméstica do pároco, alegando que era para pagar um pouco dos incômodos que tinha dado.

119 - No dia 23 de novembro de 1891, Dom Marello foi convidado para participar dos festejos, junto aos Carmelitanos de Santa Ana, do centenário de morte de São Giovanni da Cruz, na cidade de Gênova. Cirillo Penco, presente na solenidade relata: ”Era a primeira vez que via (Dom Marelllo) e tive imediatamente a impressão de estar diante de um santo. Isso era demonstrado pelo seu comportamento circunspeto, humilde e muito paterno. Essa impressão foi condividida com os meus confrades, os quais exclamava ‘Que bispo santo!’. Suas palavras  tinham algo de diferente dos demais, algo, que segundo o meu parecer era sobrenatural. Esse sentimento edificador, lembro-me, tiveram todos os meus confrades, deixando entre nós a lembrança de um santo e zeloso bispo, como já tínhamos ouvido falar de sua fama.”

120 - Em visita pastoral à paróquia de Montechiaro-Denice, Marello pediu para ser levada em seu quarto uma relíquia ex ligno Sanctae Crucis D.N.J.C e ali a adorou por aproximadamente duas horas, conforme o relato do então pároco, Pe. Francesco Pronzato. De fato, Pe. Garberoglio relata que Marello tinha uma grande devoção pela Paixão de Jesus Cristo e não apenas incutia em seus filhos a devoção à Paixão, colocando na oração da noite a leitura diária de uma página de suas dores, dos seus tormentos, mas se comprazia ele mesmo, fechando-se por duas horas durante uma visita pastoral para venerar a sagrada relíquia.

121 - Ao visitar a paróquia de Turpino em 1892, acolheu as lamentações do pároco que reclamava não ter dinheiro para pagar-lhe o almoço; Marello levando em consideração a triste situação deste, ao chegar a sua casa, lhe enviou 50  liras.

122 - Pe. Macciò, encontrando-se em Cassinelle para a pregação de um retiro espiritual por ocasião da visita pastoral do bispo, relata que participou nesta oportunidade da consagração da igreja. Ao iniciar a celebração na igreja de San Defendente, descobriu-se que faltavam o turíbulo e o incenso. Dom Marello simplesmente disse que esperava que fossem buscar o turíbulo, mas para isso devia espera uns vinte minutos. Enquanto isso, Marello perguntou ao Pe. Macció sobre o povo de Martina (lugar onde ele morava) e se entreteve com os coroinhas conversando com eles como um pai e quando finalmente chegou o turíbulo, com toda a calma começou a celebração sem dar o mínimo sinal de descontentamento, para admiração de todos os presentes.

123 -  Durante a visita pastoral em Morbello, relata Pe. Peloso, secretário de Marello,  estávamos quase para ir embora depois da frutuosa visita quando desencadeou um furioso temporal acompanhado de uma chuva de pedras. A população, diante do ocorrido ficou profundamente triste. Neste ínterim, Dom Marello subiu até o quarto para rezar. Terminado o temporal, partimos para a paróquia de Gronardo, caminhando sobre as pedras de gelo caídas  com a chuva. Durante todo o trajeto percorrido se percebia no rosto  dele a tristeza e a preocupação. O povo não abandonou o clima festivo da visita do bispo, embora aquela chuva tivesse destruído toda a colheita do ano, mas em compensação recebeu de Marello palavras que tocaram os seus corações e que elevaram o ânimo de todos fazendo esta visita render bons frutos. Dom Marello foi sensibilíssimo ao sofrimento daquele povo, manifestando com a sua dor, as suas lágrimas e as suas palavras os sentimentos que acalmaram de tal forma aquelas pessoas desoladas que a visita pastoral não sofreu nenhum dano. Terminada a visita, enviou ao pároco de Gronardo uma ajuda para que fosse distribuída aos mais pobres.

124 - Em setembro de 1892, Marello realizava a visita pastoral em Ponzone da qual o pároco desta localidade o lembra pelas suas pregações cheias de palavras divinas, pela sua docilidade e afabilidade para com todos, pela sua fineza na conversa. Lembra ainda que sua paróquia tinha sob sua jurisdição outras 4 igrejas, dentre as quais a de Piancastagna. Era costume naquela época que, por ocasião da visita pastoral, as crianças dessas igrejas fossem levadas para a paróquia de Ponzone para a recepção do sacramento da crisma. Aconteceu que os fieis de Piancastagna decidiram não levar as crianças para a crisma na referida paróquia e pretendiam que o bispo fosse crismar-lhes na sua igreja. Contudo, Marello não cedeu à pretensão destes, resistindo às insistentes pretensões e ameaças dos representantes de Piancastagna. Somente depois que os fieis aceitaram a decisão de levar as crianças para Ponzone foi que Dom Marello se dispôs ir visitá-los. Piancastagna era distante 12 quilômetros de Ponzone e a estrada era uma subida à altura de 800 metros, uma estrada que se podia fazê-la a cavalo ou a pé e Marello a fez a pé, acompanhado por personalidades de Ponzone, médicos, reitor, chanceler... Ao chegar a Piancastagna abordou o incidente de tal maneira que os fieis reconheceram o próprio erro e demonstraram-lhe veneração, amor e alegria acompanhada de reverência.

125 - O secretário de Dom Marello, Pe. Peloso relata que o seu bispo manifestava um grande amor pelo próximo e tal amor não podia ter outra origem a não ser no amor de Deus. Os padres que iam conversar com Marello na cúria episcopal saiam confortados. Um destes, que não queria conversar com ele, mas que depois foi, saiu daquele encontro com ele tão disposto a fazer tudo o que Marello lhe indicou a tal ponto que exclamou: ”Com aquele homem não se pode proceder diferente,  precisa fazer tudo o que ele deseja”. Nunca nenhum padre antes de ir conversar com ele perguntava ao secretário como estava o humor do bispo, ao contrário do que acontecia com o seu sucessor.

126 - Quando Marello se encontrava em Strevi tinha como lugar predileto a capela onde rezava com tanta concentração que parecia um santo, conforme diziam os seminaristas. Ali ele encontrava-se com as pessoas que iam até lá para vê-lo, distribuía santinhos para as crianças, descansava e se abastecia espiritualmente. As pessoas que se encontravam com ele eram recebidas com tanta afabilidade que ao saírem diziam: ”Como é bom este bispo; é mesmo um santo”.

127 - O cônego Cerutti afirma que Marello usava cilício para fazer penitência e, além disso, mesmo nos dias mais frios do rigoroso inverno astigiano, fazia a penitência de nunca colocar as mãos nos bolsos.

128 - Pe. Garberoglio testemunha que Marello quando conversava tinha uma modéstia cativante, serena, jovial e com graça, sem que jamais as suas brincadeiras e as suas palavras fossem contrárias a circunspeção devida a ele e a nós. Nós sentíamos que ele tinha uma grande afeição por nós, mas era muito reservado em manifestá-la, limitava-se, contudo, a colocar algumas vezes a sua mão sobre a cabeça das crianças.